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quinta-feira, 26 de agosto de 2010

Chegou a hora de acabar com o braile?

A tecnologia dedicada a ajudar deficientes visuais tem evoluído muito. Novas ferramentas vêm ampliando o acesso de cegos à informação escrita: audiolivros, softwares que lêem em voz alta o e-mail que acabou de chegar, serviços telefônicos que leem o jornal pela manhã. Sem duvida, uma mão na roda, que dá mais opções aos cegos

Essas novidades conquistaram espaço. E, confiando nelas, os cegos estão deixando de ler. Estão apenas ouvindo. Há deficientes visuais que já aderiram completamente à tecnologia. Alguns professores de escolas para cegos também não veem mais espaço para o braile. Tanto que quase 90% das crianças cegas americanas estão crescendo sem aprender a ler e escrever. Isso é um sinal de progresso? Devemos celebrar o declínio do braile?

É verdade a tecnologia permite a absorção rápida de muita informação. O problema é que essas novas ferramentas oferecem um tipo passivo de leitura. Ao contrario do braile, que permite uma leitura ativa. Com ele, o cérebro recebe as informações de forma diferente: alem do conteúdo, absorve também as letras, a pontuação, a estrutura do texto.

A falta desse conhecimento pode prejudicar a formação de alguém. Aconteceu comigo. Perdi parte da visão aos sete anos de idade. Aos 16, fiquei completamente cego. Não fui alfabetizado em braile quando criança, e tive de aprender a ler e escrever sozinho depois de cego. O aprendizado tardio prejudicou minha educação e minha confiança. Quando entrei na universidade, não podia soletrar. Sabia pouco sobre pontuação e regras gramaticais. Fiz um doutorado em administração da educação, mas a alfabetização limitada foi sempre uma barreira.

Hoje uso muita tecnologia de áudio. Com ela, posso ler o texto no computador em um ritmo de 250 palavras por minuto. Com o braile, leio 50 palavras por minuto. Mas a tecnologia é complicada para reuniões e palestras. Se preciso ler um discurso que escrevi, buscar notas no meio de uma apresentação, consultar tabelas, só o braile evita que eu desvie a atenção do conteúdo principal.

É como para as pessoas que têm visão: radio e TV são métodos úteis de conseguir informação, mas não substituem a leitura. Não quero dizer que a tecnologia de áudio não é importante na vida dos cegos. Ela é. Mas deficientes visuais necessitam de uma maneira eficiente de ler e escrever, como todo mundo. Isso significa que precisamos garantir o acesso a todo tipo de tecnologia que apareça e seja capaz de auxiliar. Sem esquecer também de trabalhar para manter o braile vivo.


Fonte: Superinteressante 08/2010; autor: Frederic K. Schroeder, vice presidente da Federação nacional dos cegos dos EUA




Um comentário:

Anônimo disse...

Ótimo esse texto, a leitura é tudo, até mesmo para os deficientes visuais.

Tiago Ramos - PR