Submarino

Páginas

sexta-feira, 27 de novembro de 2009

Os Dois Lados de um Mesmo Crime (Wanessa Potter)

                    Estava eu um dia desses parada numa padaria, esperando uma colega de trabalho, quando entrou na padaria um senhor. Um mendigo. Barba grisalha, tomando conta do rosto, roupas em farrapos. Vi então a moça da padaria fazer algo que aprendi a fazer quando trabalhei dois dias numa padaria. Ela pegou
um pãozinho, pos dentro de um pacote e entregou para aquele senhor.
Muitos me chamam de dura. Já me disseram que tenho uma pedra de gelo no lugar do coração. Não me importo. Ao contrario, tambem me considero dura. Mas existem poucas coisas que machuquem mais meu coração do que a visão da pobreza. Não sei. Não sei explicar porque. Sinto algo terrível dentro de mim, um aperto implacável em meu coração. Não sei. São nessas horas que penso em coisas como meus 39 pares de brincos, e me ponho a pensar: que mundo é esse? Quem eu sou? O que nós fizemos e continuamos a fazer? Na verdade, a pobreza nunca vai acabar. Nem a pobreza, nem a violencia, nem a injustiça, nem todas as imperfeições do mundo. Por que o ser humano é imperfeito. E Deus, onde entra nessa? É o menino malvado com a lupa, sentado ao lado do formigueiro?
Absolutamente. Ninguem sabe o que Deus quer, mas o mais provavel é que Ele quer que ajamos. É muito facil dizer que eu creio em Deus. E é exatamente isso que Ele quer. Sua fé. Mas e seu irmão? Ele não se alimenta de sua fé. Ele se alimenta de pão, precisa se vestir, e é sempre bom um abraço ou uma palavra de conforto. Estamos fazendo isso? Não. Estamos gastando nosso hipócrita dinheiro em 39 pares de brincos e coisas semelhantes.
                    Eu não assisto novela. Odeio novela. Não tenho tempo a perder com essas asneiras que não enriquecem, só apodrecem. Mas minha mãe, pobre coitada, é, enfim, brasileira. Sentei à mesa de minha casa para comer, certa noite, e o que vejo passando na televisão? Uma moça dentro do mar tirando sua calcinha (dentro do mar) e jogando-a para um homem que estava na beira da praia. Um homem que ela sabia que era casado. O que ele fez?
Tirou a cueca e entrou no mar.
Eu não sou puritana. O que voces querem? Que seus maridos entrem nus no mar com outra mulher? Que suas mulheres tirem a calcinha para outro homem? O que é isso? Isso não é puritanismo, é bom senso. Traição é motivo de piada e vingança. Sexo é coisa para simplesmente se matar a fome, mais nada. Onde está o bom senso? O sexo, o amor, tudo foi banalizado, tudo é mercadoria. São essas novelas imbecis, essas cretinices, esses filmes, livros, series, tudo, tudo constrói um mundo sem um pingo de bom senso. Esse é o mundo em que nossos filhos crescem, são essas coisas que eles vêem na televisão. É isso que voce quer, que sua filha tire a calcinha para um homem casado? Que seu filho traia a esposa, morra de AIDS? Chega! Quem tenta tocar no assunto, como eu, é ridicularizado, ou pior, é ignorado. Mas eu não me importo. Que me ignorem. Minha mente não se calará. O mundo é uma droga, e isso nunca vai mudar, mas alguma coisa eu posso fazer. Impedir, ou ao menos tentar, que as coisas piorem.

(Wanessa Potter)

Nenhum comentário: